O projeto baseia-se em três grupos distintos de problemas a aprofundar:
1) Primeiro grupo: Os modernos fundamentos modernos da interpretação do contrato.
A doutrina tradicional sobre a interpretação dos negócios jurídicos baseia-se na vontade das partes e assume como paradigma os contratos bilaterais de execução instantânea. A realidade é, porém, muito mais complexa e plurifacetada. O aumento de contratos automáticos e massificados nas sociedades modernas, muitos deles criados por IA, o fenómeno dos contratos nascidos e celebrados em plataformas digitais, e a existência de uma significativa intervenção de terceiros na formação do contrato, por exemplo, colocam novas questões à ciência jurídica: qual o fundamento do vinculum? Será a voluntas tão determinante no processo interpretativo como o foi no passado? A interpretação procura descobrir a vontade real das partes ou o seu escopo está antes associado à proteção da confiança e à repartição do risco?
Os critérios de interpretação fixados no Código Civil não dão respostas satisfatórias a estas questões: como é que devemos lidar com isso? Quais são as práticas observadas noutras jurisdições historicamente ligadas ao sistema português (Alemanha, França e Itália, por exemplo)? Será possível conceber um método único de interpretação ou deveremos assumir uma pluralidade metodológica, no que diz respeito à interpretação de textos normativos?
2) Segundo grupo: Regras de interpretação.
É muito comum, sobretudo em contratos internacionais, que as partes prevejam várias cláusulas relativas à interpretação do próprio contrato. Como interpretar as cláusulas que têm por objeto, justamente, a interpretação? Serão essas cláusulas válidas à luz do direito português? Quais são os limites da autonomia privada nesta matéria?
3) Terceiro grupo: Formação e interpretação da vontade das pessoas coletivas.
Uma parte muito significativa dos negócios jurídicos celebrados em qualquer jurisdição têm por partes pessoas coletivas, em especial, sociedades comerciais.
O conhecimento e a vontade das pessoas coletivas colocam questões especialmente difíceis, que permanecem ainda hoje sem resposta. Se as pessoas coletivas não têm qualquer suporte psicológico ou biológico, como podemos estabelecer uma forma normativa de saber algo ou de querer algo?
Estas questões não são novas, mas o impacto destas questões na formação e interpretação dos contratos ainda não foi estudado.
Devemos aplicar os mesmos critérios hermenêuticos que aplicamos à interpretação dos contratos celebrados entre pessoas singulares, quando em causa estão pessoas coletivas? Sendo negativa, a resposta, que critérios de interpretação devem ser observados?
E qual é jurisdição relevante: a lei que regula o contrato ou a lei pessoal da pessoa coletiva em causa?
As questões suscitadas têm especial relevância e atualidade. Integram o núcleo fundamental da linha de investigação em que o projeto se insere e exigem a articulação com as outras linhas de investigação do CIDP, em especial com a linha Diversidade, Harmonização e Unificação do Direito Privado.
O projeto de investigação será implementado em duas fases:
- Primeira fase (de janeiro de 2025 a dezembro de 2026)
Cada investigador deverá escolher um a três tópico dos três grupos de problemas supra identificados e começar a trabalhar num artigo destinado a uma publicação coletiva.
Os trabalhos em curso deverão ser discutidos em reuniões periódicas da equipa (sempre aberta a todos os investigadores que desejem participar) e melhorados com os contributos de todos.
Durante este período, serão organizadas duas conferências internacionais (infra melhor identificadas).
- Segunda fase (de janeiro de 2027 a dezembro de 2027)
Elaboração de uma obra coletiva em inglês que recolha os trabalhos elaborados por todos os investigadores, publicação e divulgação internacional da obra.
Aquando da publicação da obra, realização de um Curso Intensivo sobre interpretação contratual.