Os Organismos de Investimento Coletivo (OIC) são entidades, com ou sem personalidade jurídica, que têm por objetivo o investimento coletivo de capitais obtidos junto dos investidores, de acordo com uma política de investimento previamente estabelecida. Compreendem sociedades de investimento coletivo e fundos de investimento.
O mercado dos OIC está a crescer em Portugal, enfrentando desafios e representando oportunidades tanto para os agentes do mercado como para os reguladores.
Os OIC são essenciais como veículos de investimento das empresas, proporcionando, a um espectro amplo de empresas, os recursos que necessitam para desenvolver os seus planos de negócio. São também fundamentais como alternativa de investimento para investidores privados e institucionais que preferem não correr o risco de investir diretamente em empresas-alvo, mas que desejam investir num OIC gerido profissionalmente e que diversifica o seu risco investindo numa carteira de empresas.
Além disso, os OIC estão a desempenhar um papel cada vez mais importante na transição para uma economia mais sustentável, implementando estratégias de investimento ecológico que os investidores individuais não conseguem implementar sozinhos. Tudo isto contribuiu para tornar os OIC numa parte essencial e impulsionadora do movimento de reformulação dos mercados de capitais, a nível internacional e nacional.
Neste contexto, as entidades reguladoras procuram assegurar um nível adequado de proteção do mercado e dos investidores, regulando a inerente intermediação financeira. Em Portugal, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) promoveu recentemente uma renovação e simplificação do regime da gestão de ativos, que acabou por ser aprovado pelo Decreto-lei n.º 27/2023, de 28 de abril (o “Regime de Gestão de Ativos” ou simplesmente “RGA”).
O RGA, não só prevê novas categorias de OIC e de sociedades gestoras, redefinindo, assim, o mercado de capitais, como também cria novas possibilidades em termos de atividades de investimento autorizadas, procedimentos de autorização, conflitos de interesses, emissão de obrigações ou comercialização de unidades de participação.
Não obstante a sua importância substancial, os OIC têm sido negligenciados pela doutrina jurídica. Os apelos dos profissionais do mercado no sentido de obterem orientações claras sobre a forma de interpretar, aplicar e garantir o cumprimento do seu regime jurídico têm sido ignorados. Até à data, não existe uma única obra coletiva, livro de investigação ou monografia que contemple esta matéria do princípio ao fim. Além disso, no que respeita à grande maioria das questões, não se encontra uma única linha de texto publicada.
Há cinco anos, o CIDP deu um primeiro passo no sentido da alteração do status quo nesta matéria, reunindo académicos e profissionais para refletir sobre uma série de temas no Curso Intensivo em Fundos de Investimento. Este curso terá a sua 6.ª edição no final de 2023.
Chegou o momento de aproveitar o que foi alcançado até agora e promover um projeto de investigação aprofundado sobre esta matéria. Este projeto de investigação reunirá académicos nacionais e internacionais de diferentes gerações e profissionais experientes para produzir novos conhecimentos e oferecer ao mercado de capitais uma análise transversal, abrangente e aprofundada do RGA, das disposições sancionatórias relevantes do Código dos Valores Mobiliários e do modelo de regulação adotado em Portugal.
Podem vir a ser extraídos benefícios importantes, não só do ponto de vista teórico, mas também de uma perspetiva prática.
Por um lado, ao permitir que os intermediários financeiros compreendam melhor o regime jurídico aplicável, permitir-lhes-á avaliar melhor os seus riscos de cumprimento e reduzir os seus custos de cumprimento normativo. Como estes custos são sempre transferidos para os seus clientes, o conhecimento adquirido reduzirá também o custo de investimento para os investidores em geral. Por sua vez, essa redução tem o potencial de diminuir o custo de capital para as empresas, estimulando assim o crescimento económico e a criação de emprego.
Por outro lado, pode também contribuir para melhorar a eficiência e a imparcialidade da supervisão pública, as regras e os procedimentos de aplicação da lei e cumprimento normativo e implementar melhores políticas de regulação.
A equipa do projeto centrar-se-á no desenvolvimento de trabalho de campo para identificar os principais problemas enfrentados pelos agentes do mercado (com a APFIPP e outras instituições), no desenvolvimento de investigação a nível internacional e na produção de uma obra coletiva (textbook), em inglês.
Relativamente à obra coletiva, a ideia é que cada investigador trabalhe com os investigadores principais que serão coautores de cada capítulo da obra coletiva e assegurarão um diálogo transversal entre todos os investigadores no projeto.
A obra coletiva pretende, assim, ser o resultado de uma investigação em colaboração e em diálogo constante entre os investigadores, e não uma simples compilação de artigos escritos por cada investigador individualmente.
O projeto será composto por 5 fases:
- Uma análise da legislação – abrangendo tanto o Direito dos livros (law in the books) como o Direito da prática (law in action) – nos mercados mais relevantes para os OIC;
- Uma reflexão de direito comparado baseada na fase 1;
- Uma introdução aos pilares de direito europeu que moldam grande parte do regime jurídico que rege os OIC em todos os estados-membros;
- Uma reflexão sobre o trabalho de campo desenvolvido com a APFIPP e outras instituições parceiras para identificar os principais problemas enfrentados pelos agentes do mercado;
- Uma discussão aprofundada sobre o RGA português a três níveis:
- O direito europeu aplicável a cada tema em causa;
- O direito português em transposição/execução e/ou para além dos limites do direito europeu;
- O sistema de controlo, com especial enfoque no direito penal e no direito contraordenacional, no âmbito do “direito sancionatório dos valores mobiliários” previsto do Código dos Valores Mobiliários.
Os investigadores internacionais desempenharão um papel particularmente importante nas fases 1 a 3 e 5. Na fase 4, o diálogo com as instituições parceiras favorecerá uma melhor interação entre a teoria e a prática.
O trabalho coletivo será apresentado publicamente numa conferência internacional e espera-se que contribua para a criação de futuros cursos e seminários do CIDP e da FDUL sobre este tema.