A autonomia privada, apesar de ser um pilar histórico e axiológico basilar do nosso Direito (em especial do Direito Civil), não é facilmente determinável em razão do seu conteúdo e dos seus limites. Em especial no âmbito societário, marcado pela acentuada e rápida transformação das organizações, a discussão em torno da liberdade contratual está em constante mutação porque sucessivamente testada em face do aparecimento ou importação de novas figuras e de diferentes necessidades dos agentes naquelas organizações.
Esta existência generalizada de dúvidas sobre os limites da liberdade negocial tem alimentado as querelas doutrinárias quanto às matérias a regular tanto nos estatutos, como nos acordos parassociais, num debate que tem colhido frutos: permitiu, desde logo, ultrapassar as dúvidas quanto à admissibilidade destes acordos ou, ainda, quanto ao seu âmbito subjetivo. A discussão não se esgota, porém, no desenho dos acordos parassociais. É necessário posicioná-la à luz da compatibilização das diversas cláusulas importadas da prática internacional com o direito português (que, porque difícil, prejudica a contratação tanto com investidores nacionais, como com investidores internacionais) e dos desafios éticos suscitados pela orgânica paralela que resulta dos acordos parassociais ou por neles se definirem, muitas vezes, objetivos empresariais “na sombra”.
Estas reflexões, sendo necessárias, carecem de concretização prática, com vista à estabilização destas questões num corpo contratual concreto que permita nortear, na discussão junto dos agentes, os limites da parassocialidade. Esse será o nosso principal objetivo com este projeto: influenciar a prática da contratação parassocial em termos de eficiência e ética empresarial, aproveitando as potencialidades do sistema jurídico.
Pretendemos, para esse efeito, distinguir a nossa análise e o resultado da investigação não apenas em razão do diálogo próximo com a prática, mas também da sinergia com outras áreas científicas que influenciam a solução jurídica, como seja a área empresarial e, em especial, da gestão de empresas. Como tal, porque movidos pela necessidade de alargar a discussão não apenas a agentes económicos, mas também a académicos nestas áreas, estabelecemos colaborações [formais/informais] com [elencar em razão da lista final].
Este projeto insere-se no âmbito da linha de investigação do CIDP sobre Novas Perspetivas da Corporate Governance e representa uma das principais transformações no Direito das Sociedades Comerciais, cada vez mais marcado pelo reforço da parassocialidade. Para além disso, o escopo da investigação está alinhado com as demais linhas de investigação aprovadas para o período de 2024/2029 e, em geral, com os objetivos prosseguidos pelo CIDP. A discussão em torno do conteúdo e limites da liberdade contratual, ainda que direcionada para os acordos parassociais, conhece uma importância transversal para a ciência jurídica e, em especial, para o Direito Privado. É, por isso, uma área central para o Direito Privado comum e comercial e concretiza um dos seus fundamentos históricos, dogmáticos e axiológicos, em linha com o estudo dos Fundamentos do Direito Privado. Também a metodologia adotada e os resultados da investigação visam refletir a diversidade do Direito Privado, comungando da abordagem própria do Direito Comparado subjacente à linha de investigação da Diversidade, Harmonização e Unificação do Direito Privado.
Investigador responsável
Investigadores
Consultores
- Ordem dos Advogados
- ASAP – Associação das Sociedades de Advogados de Portugal
- IPCG – Instituto Português de Corporate Governance
- Associação Empresarial de Portugal
- BRU-ISCTE
- M&A Worldwide
O projeto será implementado nas seguintes três fases:
Fase 1: recolha de informação e estudo de mercado
- Toolbox de acordos parassociais: recolha de informação sobre prática relativa a acordos parassociais, tanto na jurisprudência como na contratação empresarial, com o objetivo de construir uma base de dados de casos e cláusulas, que permita identificar principais áreas críticas;
- Estes dados serão utilizados para preparar um inquérito dirigido àqueles que, na prática da sua profissão, estão em contacto com estas matérias (essencialmente advogados e sociedades de advogados), tendo em vista aferir as principais dificuldades de acomodação da prática ao sistema jurídico, tanto da perspetiva dos sócios internacionais como nacionais;
- Com base nas conclusões obtidas, será elaborado e divulgado um relatório, que servirá de suporte à construção do que designamos por master agreement ou, em português, acordo mestre.
Fase 2: perspetivas de direito comparado
- Serão chamados especialistas internacionais para facilitar a análise de direito comparado sobre os limites da liberdade contratual e os constrangimentos com que as diversas cláusulas típicas se confrontam nos diversos ordenamentos jurídicos;
- A dimensão ética dará origem a discussões sobre temas sensíveis com impacto social;
- Estes resultados serão publicados congregando as componentes teórica e prática em matéria de acordos parassociais.
Fase 3: o master agreement como resultado da investigação
- Na sequência das iniciativas do Projeto e da pesquisa realizada, caberá aos Investigadores a preparação de artigos científicos, em inglês, para incluir numa obra coletiva a publicar em editora internacional;
- Será, finalmente, preparado e publicado um modelo uniformizador das cláusulas típicas com vista a ser utilizado na contratação em que seja aplicável a lei portuguesa (o designado master agreement ou acordo mestre).
A equipa de investigação do projeto foi desenhada à luz dos objetivos aqui identificados. Se, por um lado, a variedade e senioridade do grupo de investigadores permitirá conduzir uma investigação detalhada sobre a parassocialidade, expondo-os à técnica da investigação, por outro lado, tem ainda a vantagem de proporcionar discussões novas sobre o alcance da liberdade contratual e das implicações éticas que aqui se suscitam. A preparação do master agreement careceria, porém, de uma visão mais experimentada sobre a condução das negociações das cláusulas tipicamente refletidas nos acordos parassociais. O grupo de consultores do projeto visa, essencialmente, o acompanhamento dos resultados da investigação à luz da prática comercial (nacional e internacional), bem como testar a viabilidade técnica e prática do equilíbrio contratual que ali será refletido.